Seminário de Seguridade Social defendeu o fortalecimento da luta para reverter cenário de desmonte da proteção social

O cotidiano profissional das/dos assistentes sociais vem sendo marcado pelo aumento das demandas pelos serviços de Previdência Social, Assistência Social e Saúde, em um contexto de desmonte destas políticas públicas que integram a Seguridade Social. Uma realidade complexa que exige respostas das/dos profissionais em seu cotidiano.

Para qualificar o debate e subsidiar as/os assistentes sociais, a seccional de Cascavel e os Nucress de Campo Mourão e de Maringá, promoveram o Seminário sobre Seguridade Social de 23 a 26 de novembro.  A atividade estava prevista no Plano de Metas 2020 CRESS-PR.

Os debates foram divididos em quatro dias, nos quais foram abordados os temas: Contextualização da Seguridade Social e desafios para o Serviço Social, Assistência Social, Previdência Social e Saúde.  As expositoras foram as assistentes sociais conselheiras do CRESS-PR: Vanessa Rombola Machado, Jucimeri Isolda Silveira, Márcia Lopes, Maria Geusina da Silva, Viviane Peres, com mediações de Tânia Backschat, Lucilene Silva e Diuslene da Silva.

A abertura do seminário foi realizada pela presidenta do CRESS-PR, Andrea Braga, a coordenadora da seccional de Londrina, Liana Bassi e a coordenadora da seccional de Cascavel, Edyane de Lima.

“O evento foi extremamente importante, debatendo aspectos relevantes e atuais da seguridade social, em que as expositoras abordaram uma análise da conjuntura nacional  e regional, sobretudo no que remete à atuação profissional da categoria do Serviço Social no tripé (Assistência Social, Saúde e Previdência Social) da Seguridade Social”, afirma a coordenadora da seccional de Cascavel, Edyane de Lima.

Ela destaca também que o espaço foi um momento de reflexões e debates sobre os desafios do engajamento e mobilização das/dos assistentes sociais.  “Foi possível qualificar o debate no apontamento de inferências nos espaços de atuação profissional das políticas de Saúde, Assistência Social e Previdência Social, numa perspectiva de resistência. Denotando a necessidade de mobilização para assegurar os direitos sociais que estão ameaçados.”

Veja o que algumas assistentes sociais que participaram falam sobre o debate

Elizabeth de Souza Carvalho Gomes

“Eu me formei em 2009 e comecei a atuar há pouco tempo como assistente social em um ambulatório de modelo de atenção à saúde do idoso, no Consórcio Intermunicipal de Saúde de Umuarama. Amei as apresentações, amei o conteúdo, ver as assistentes sociais explanando me fez lembrar porque escolhi fazer Serviço Social. Essa paixão pelo Serviço Social tinha ficado adormecida por tanto tempo e floresceu com esse debate. Espero que tenha mais desses eventos e que possa, logo, logo, ser presencial.”

Maria Aparecida Melo Meneses Tamparowsky

“Pertenço ao Nucress de Cascavel e atua na APAE de Assis Chateaubriand. O Seminário de Seguridade Social é um instrumento que reafirma os compromissos da categoria com a profissão. As assistentes sociais, que são mestras e doutoras, juntamente com as mediadoras, apresentaram a conjuntura atual, mostrando o cenário político atualizado, e, com isso, nos levaram a reafirmar o compromisso com a classe. Esse seminário foi um chacoalhão empolgante e eu recebo como um desafio. Não estamos só, estamos sendo bem encaminhadas. Mais ações como essa serão sempre bem-vindas. Parabéns aos Nucress pela organização.”

Raquel Rodrigues Alegre Pagliarini

“Esse seminário foi de grande importância para todos e todas  profissionais que atendem o público, como formação continuada. Para mim, agregou bastante este conhecimento sobre as políticas públicas no contexto de pandemia. Eu estou na Defensoria Pública, não atuo diretamente com as políticas de Seguridade Social, mas por serem políticas básicas, perpassam meu cotidiano também. Assim, ampliar ainda mais este conhecimento, qualifica mais os encaminhamentos na Defensoria Pública. E neste contexto de pandemia, as ações remotas possibilitam o acesso mais fácil a essa capacitação. As tecnologias vêm para enriquecer nosso trabalho. Foi muito válido as seccionais e os NUCRESS se organizarem para trazer estas capacitações.”

Você perdeu o Seminário, mas o tema te afeta no seu cotidiano profissional? Trazemos aqui um pouco de algumas abordagens das palestrantes.

É tempo de aprofundar o senso crítico para alimentar a luta Andrea Braga, presidenta do CRESS-PR, na abertura do seminário.

“Realização de encontros como este, reafirmam o compromisso da nossa categoria com a defesa da seguridade social pública, gratuita e universal. Em que pesem as grandes dificuldades neste cenário (numa conjuntura de aceleração e intensificação de medidas regressivas que contribuem com o desmonte das políticas sociais e restrição de direitos), estamos sempre buscando estabelecer processos de reflexão e incidência conjunta.

Vivemos em um momento difícil em que a seguridade social vem sendo atacada de diversas formas. O cenário de desmonte da seguridade social tem sido intensificado pelas “reformas ultraliberais”, com ataques a direitos e benefícios sociais. Ataques aos direitos de todos trabalhadores e trabalhadoras, que se materializam nas propostas da reforma trabalhista, da reforma administrativa, na terceirização irrestrita e no novo regime fiscal.

O nosso acúmulo político e teórico requisita o aprofundamento da crítica para alimentar a luta, pois, mais que nunca, vem a certeza de que só a luta e a organização coletiva movem a história. Espaços como esse articulado pela Seccional, que congregam várias regiões do estado, são fundamentais para análise e alinhamento conjunto de articulação e incidência.

Essas ações em conjunto fortalecem as possibilidades de resistência em busca de melhores condições de vida e trabalho para as/os assistentes sociais e demais trabalhadores/as”.

 “Contextualização da Seguridade Social e desafios para o serviço social” (Jucimeri Isolda Silveira)

A seguridade social tem sido inviabilizada pela vigência da Emenda Constitucional n. 95/16 que congelou os recursos para as políticas sociais por 20 anos. Uma medida ultra neoliberal adotada apenas no Brasil, considerada uma violação dos direitos da população. Os recursos não estão apenas congelados, foram retirados e isso precisa ser revertido.

Os ataques à seguridade social afetam diretamente a categoria de assistentes sociais quanto às condições de trabalho e a possibilidade de provisões no acesso da população aos direitos. Somos afetadas/os como classe trabalhadora e profissionais que atuam de forma predominante nas políticas sociais.

A carta de Maceió, aprovada no Encontro Nacional do Cfess/Cress em 2000, é um marco na construção coletiva sobre a seguridade social que defendemos. Defendemos uma seguridade social universal, democrática, redistributivista, integralizada. Por isso, nossa agenda integrada com os movimentos sociais e organizações que defendem direitos é por reformas estruturantes como a tributária. Fazemos parte de diversos espaços de resistência em defesa da agenda de direitos, pela redução das desigualdades. 

Direitos Valem Mais é um exemplo da nossa luta unificada, já que é uma coalizão que integra diversos movimentos e organizações. Na coalizão,  temos realizado ações em defesa da Seguridade Social, como, por exemplo, emendas revogatórias do teto dos gastos; ações judiciais junto ao Supremo Tribunal Federal; defesa de um piso emergencial para politicas essenciais de saúde, assistência social, educação e segurança alimentar; ações contra a proposta do governo de pacto federativo; defesa de uma reforma tributária justa e solidária.

Nossa luta incansável tem como horizonte uma sociedade emancipada. Defesa dos direitos, da democracia, de uma seguridade social universal, compõe nossa agenda de direitos mais urgente. Temos que fortalecer, especialmente neste contexto de pandemia que atinge a população que vive em condições mais desiguais, a luta em cada município e a luta mais geral, para revertermos este cenário e restabelecermos a construção de um sistema universal de proteção social, com efetivo controle democrático.”

ASSISTÊNCIA SOCIAL – “Assistente sociais são agentes políticos, porque atuam na defesa intransigente dos direitos da população.” (Márcia Lopes)

“Em uma breve análise histórica da profissão, desde a primeira escola de Serviço Social, em 1936, sempre houve uma participação acentuada do Serviço Social brasileiro nas grandes lutas, na defesa das bandeiras sociais, desde políticas públicas, como Saúde, Educação, debate de acesso à terra, debate sobre a criança e o adolescente, a defesa de igualdade de oportunidade para as mulheres. Seja na Ditadura Militar, na transição democrática, o conjunto CFESS/CRESS sempre se fez ouvir e se posicionou na defesa da democracia e da justiça.

Fazendo uma análise da atuação das/dos assistentes sociais nos municípios, especialmente nos pequenos, é importante saber que antes mesmo da COVID-19, já havia uma situação conhecida do ponto de vista das dificuldades em relação ao trabalhado da/do assistente social.  Seja nas prefeituras, em entidades não governamentais em empresas, cooperativas, sempre foi um desafio demarcar um espaço profissional com base no projeto ético-político e enfrentar a cultura dos municípios, principalmente os menores. Esses municípios possuem, geralmente, uma cultura assistencialista, clientelista, de muita barganha e de um modo muito tradicional de fazer política e de exercer o poder. Soma-se a isso a conjuntura nacional, vivida no mínimo a partir de 2016 com o golpe político que sofremos, e vemos que o desmonte das políticas públicas já era um cenário anterior à pandemia.

Outro ponto importante a ser abordado é a importância da dimensão política da prática dos/das assistentes sociais. Estes/as profissionais não são simples técnicos/as na sua área de atuação, são cidadãos, profissionais e agentes políticos, fundamentalmente porque atuam na defesa intransigente dos direitos da população, seja na Saúde, Assistência Social, na Justiça, nas políticas transversais. Então, nesse sentido, faz uma grande diferença quando essa/esse profissional se posiciona em todos os momentos, principalmente, agora, na pandemia. Momento, esse, em que o Serviço Social teve que fazer uma reorganização dos serviços para garantir os direitos da população. Então, ao invés de fechar serviço, de restringir, de não dar acesso, houve a posição de continuar com todos os serviços funcionando, inclusive ampliando alguns.

Os/as trabalhadores/as têm que criar condições para viabilizar esses serviços, seja via internet, seja com carro de som, seja inovando em seus processos, em um momento como o atual em que a população se sente desprotegida, pela falta de condições de seguir as orientações sanitárias, pela falta de emprego, pelo aumento da violência.

É fundamental reiterar que a formação, a militância, o engajamento no órgão da categoria, nos fóruns, nos conselhos municipais é que promovem mudança e que dá a dimensão ética e politica da profissão conforme estabelece seu projeto ético-político.”

SAÚDE – “Precisamos revitalizar e sensibilizar os movimentos políticos e sociais, os conselhos de direitos compostos por sujeitos capazes de assegurar o direito à saúde” (Maria Geusina da Silva)

“É preciso compreender que o direito à saúde na sociedade brasileira, carece de um novo olhar e de revisão na sua implementação. Um repensar que deve envolver concepções democráticas, significados e sentidos dos sujeitos que deles usufruem, de forma contextualizada e historicamente situada, com vistas a apreender os conflitos e as contradições presentes na luta entre Estado e sociedade para sua efetivação.

É indispensável revisitar e dar visibilidade social, no âmbito do SUS, ao debate dos Determinantes Sociais de Saúde, para todos os trabalhadores de saúde, em especial as/os assistentes sociais, uma vez que esses/as buscam identificar, analisar e correlacionar os aspectos sociais, econômicos, culturais e políticos que atravessam o processo saúde-doença, vivenciado pelo usuário, seus familiares e amigos, mobilizando estratégias de enfrentamento dessas questões num contexto de trabalho coletivo.

Os principais desafios residem no fortalecimento e reconhecimento do sistema de proteção social conquistado na constituinte de 1988 pela mobilização dos movimentos sociais e dos trabalhadores; no fortalecimento e ampliação e descentralização do Sistema Único de Saúde e do Sistema Único de Assistência Social. 

Precisamos revitalizar e sensibilizar os movimentos políticos e sociais, os conselhos de direitos compostos por sujeitos capazes de assegurar o direito à saúde e os sistemas públicos locais, para enfrentar o legado conformista  que nas últimas décadas vem se acentuando sobre o desmonte do SUS.

O cenário atual, nos desafia à criação de estratégias políticas e de intervenção para assegurar a inclusão e o acesso integral ao SUS das populações desfavorecidas no cenário de pandemia.”

PREVIDÊNCIA SOCIAL – “Vivemos um processo de destruição da política de Seguridade Social, com Assistência Social sem recursos orçamentários, a Saúde sendo privatizada e o INSS seguindo o caminho da capitalização da Previdência Social” (Viviane Peres)

É importante colocar que desde os anos 90 a Previdência vive processos incessantes de contrarreformas, na perspectiva de restringir direitos da classe trabalhadora. Tivemos a última Emenda Constitucional 103/2019 que foi a mais profunda, atingindo tanto o regime geral de previdência quanto o regime próprio de previdência social dos servidores públicos. Em todos estes momentos de contrarreformas, o Serviço Social no âmbito da Previdência é atacado.

No contexto atual, a pandemia aprofunda o impacto de medidas na perspectiva de destruir o que conhecemos por INSS. A maior autarquia desse país, que operacionaliza a Previdência Social pública, vem com projeto de destruição total dessa política, de junção do regime próprio da previdência e do regime geral que, inclusive têm orçamentos diferentes; vem com a diminuição da sua estrutura, reduzindo agências, unidades de gestão; vem com projetos que têm como foco juntar grandes fundos de previdência e com vistas à capitalização da Previdência Social pública proposta na Emenda Constitucional 103/2019. Vale lembrar que mesmo ainda não aprovada, a capitalização da Previdência é o alvo do governo federal.

Outro ponto fundamental: internamente no INSS já vêm sendo implementados projetos de gestão que envolvem processos de trabalho do conjunto dos servidores do INSS, inclusive com metas de produtividade relacionadas ao salário. Isso é totalmente contrário ao projeto profissional, porque envolve a qualidade do serviço prestado à população.  Isso já vem acontecendo com outras áreas internas do INSS e nesse momento o INSS quer implantar essa política para toda a categoria do seguro social, inclusive para os/as assistentes sociais, que hoje atuam predominantemente no serviço social e no serviço de reabilitação profissional. Essa medida vem na mesma lógica empregada no setor privado de reestruturação produtiva, envolvendo um sistema de metas relacionadas às tecnologias, impedindo inclusive o atendimento presencial da população.

É importante colocar que a restrição ao atendimento presencial da população é um problema que vem sendo enfrentado desde 2019 com a transformação digital do INSS, ou seja, é anterior à pandemia, e aprofundado por ela. Com a criação do aplicativo Meu INSS, todo requerimento para obtenção de benefício social tem que ser feito de forma virtual, e grande parte da população que está no INSS hoje não tem acesso às plataformas tecnológicas. Estamos falando de uma população que recebe entre 1 e 2 salários mínimos, a qual corresponde a 65% da população do Paraná. Estamos falando de indígenas, de uma grande população de idosos. Essa população está indo para as políticas de saúde e de assistência social, tem pago em lan houses por um serviço que o Estado deveria oferecer nas unidades do INSS.

Para as/os assistentes sociais, essa atuação remota é uma contradição imensa ao projeto profissional. Estes/as profissionais têm total clareza de que várias atividades, como a avaliação social do Benefício de Prestação Continuada (BPC) são impossíveis de serem realizadas por canais remotos. Há inclusive posicionamento o CFESS sobre isso.

Está bem claro com a Assistência Social sem recursos orçamentários, a Saúde sendo privatizada e o INSS seguindo o caminho da capitalização da Previdência Social que vivemos um processo de destruição da política de Seguridade Social de forma geral. Isso envolve totalmente a realização das competências, das ações e das atividades do/da assistente social no INSS, pois como pensar um serviço social numa previdência capitalizada?

Se prevê a necessidade de uma luta muito grande em defesa da Seguridade Social, o que implica em defesa de uma política de saúde universal, de uma assistência social com recursos orçamentários e de uma previdência social pública, com acesso da população ao INSS, inclusive do acesso ao atendimento do serviço social. O conjunto CFESS/CRESS tem de fato que fazer uma intervenção, porque a população não está tendo acesso ao INSS, um problema estrutural que se aprofunda com a pandemia.