Seminário reuniu categoria contra retrocessos nas políticas de Drogas e Saúde Mental

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Cerca de 350 participantes estiveram presencialmente no primeiro Seminário Estadual sobre o trabalho do/a Assistente Social na Política sobre Drogas e Saúde Mental, realizado no dia 16 de março em Curitiba, na PUC-PR. O evento contou também com transmissão online, alcançando assim a categoria que não pode estar presente no local.

O seminário, realizado pelo CRESS-PR por meio da Câmara Temática de Saúde, foi um momento de estabelecer estratégias de luta e resistência na defesa da saúde pública e do cuidado em liberdade, objetivo este que já estava estampado na faixa colocada pela organização na mesa central, com os dizeres: “Trancar não é tratar”.

“Falar sobre saúde pública em nossa atualidade é essencialmente falar de resistência. Resistência à privatização e contra este modelo atual de gestão na forma de organizações sociais e fundações, que repassam recursos públicos para a iniciativa privada”, afirmou Elaine Pelaez, uma das palestrantes do evento, apontado assim para um dos principais pontos da mesa de debates do seminário: o enfrentamento necessário aos retrocessos nesta política.

O evento contou no período da manhã com mesa de debates, em que as apresentações propiciaram reflexões sobre a necessidade de fortalecer os coletivos populares em defesa da democracia e das políticas públicas, em particular do SUS Constitucional e dos Serviços de Atenção Psicossocial de base territorial/do cuidado em liberdade. No período da tarde a programação foi voltada para oficinas em que os/as participantes realizaram grupos para estabelecimento de estratégias de superação aos desafios e de fortalecimento da resistência.

 

Mesa de Debate – período da manhã

A mesa de abertura do evento foi composta pela conselheira presidenta do CRESS-PR, Joziane Cirilo, por Elaine Pelaez (CFESS e Frente contra a Privatização da Saúde), Márcia Terezinha Iliveira (PUC-PR e CRESS-PR), por Luciano Bugalski (CRP), Júlia Nogueira Micheolotto (Enesso), Maurício (MNPR), Altieres Edemar Frei (Abrasme) e Renária Moura (Frente paranaense privatização de saúde).

A mesa de debates iniciou com a fala de Elaine Pelaez, que integra a Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde. Ela contextualizou os sistemas de saúde ao longo da história: “Antes da redemocratização tínhamos uma saúde sem acesso universal, deliberadamente mercadoria ou objeto de caridade”, comentou ela, explicando que após a redemocratização no Brasil iniciou um processo até a conceituação de uma saúde ampliada, com acesso universal a todos, defendendo princípios de integralidade, descentralização e participação social: “Porém sempre houve disputa nesta área, pois os grupos que controlavam os serviços privados de saúde não querem perder espaço”. Explicou ainda que atualmente o modelo de gestão tem privilegiado propostas em que a gestão pública está sendo transferida para o setor privado, com as fundações privadas, empresa pública de serviços e organizações sociais. E criticou a política do atual governo que prioriza a privatização da saúde, contextualizando que mesmo no modelo atual os recursos públicos continuam sendo os utilizados por empresas privadas, há desvio de recursos por parte da gestão e há precarização do trabalho.

A seguir, o psicólogo Altieres Edemar Frei, da Associação Brasileira de Saúde Mental, comentou sobre os ataques que a política de Saúde Mental vem sofrendo. “Foi uma longa luta para que em 2001 tivéssemos promulgada a lei da Reforma Psiquiátrica, que mesmo após aprovada continuou sofrendo ataques, muitas vezes pela incompreensão do direito a alteridade”, comentou. Frei explicou como a história do Brasil sempre a contou com a tendência em criar políticas que ajudam a criminalizar a pobreza e aumentar o racismo. Para ele, a sociedade vive há um tempo a explosão do consumo em diversos aspectos e com relação ao uso de drogas esse alto consumo também ocorre. A resposta do poder público no Brasil, no entanto, tem criado legislações que não tratam de drogas em si, mas legislam sobre o corpo e interferem nos direitos fundamentais das pessoas. Um dos exemplos mais criticados foi a resolução aprovada pelo Conselho Nacional Anti Drogas, pautada no projeto de lei do ministro Osmar Terra. “É uma resolução pautada em uma premissa de que a posição majoritária da população é contra as drogas, sem ter havido qualquer consulta popular ou debate prévio a respeito”. Ele explicou que o PL inclui aberrações aos Direitos Humanos, como cerceamento do direito de ir e vir: “o usuário não poderá frequentar determinados lugares e terá restrição de horários”. Comentou ainda é que tal resolução é pautada na abstinência e na internação como meios efetivos, indo contra os avanços da política antimanicomial.

A assistente social Silvia Albertini fez a fala em seguida, mostrando que o panorama do estado do Paraná também está repleto de retrocessos. Apresentou elementos da conjuntura política de Saúde no estado e seus reflexos na gestão e na saúde do trabalhador. Criticou o modelo de gestão atual que inclui formas mascaradas de privatização, que eliminam concurso público, permitindo clientelismo e precarização do trabalho. Para ela, além do sucateamento dos serviços públicos, o que se vê é uma série de prejuízos para as/os trabalhadores terceirizados, influenciando na saúde do/a próprio/a trabalhador/a. “A busca por resultados quantitativos passou a ser a diretriz que vem permeando os discursos de gestão. Há um elenco de itens que não leva em consideração o processo de trabalho da equipe – hoje há metas muitas vezes inatingíveis postas ao/a trabalhador/a da saúde. E isso vem fazendo com que os/as trabalhadores/as adoeçam”, comentou ela, questionando: “como lidar com os/as usuários em situações tão delicadas se não há tempo para realizar o vínculo e tudo é pautado por metas quantitativas?”

Em nome da Comissão Ampliada de Ética do CRESS-PR a assistente social Dara Rosa fez o fechamento das falas no período da manhã antes de abrir o debate entre os/as participantes. Dara apresentou o levantamento realizado pela Comissão de Fiscalização e Orientação Profissional do CRESS-PR realizado nos últimos anos a partir de visitas a comunidades terapêuticas no Paraná. “São predominantemente religiosas, com modelo de tratamento de internamento pré-determinado, práticas laborais, inclusive para subsistência e com predominância de terminologia com caráter fortemente moral”, afirmou, com base nos dados levantados. Ela explicou que estes resultados são com base em 49 localidades visitadas, sendo 111 o total no estado. Apresentou ainda dados referentes à prática profissional de assistentes sociais nestas comunidades, comentando sobre resolução do conjunto CFESS-CRESS proibindo a vinculação do exercício profissional com práticas terapêuticas. Os dados da fiscalização incluíram também a visita a CAPS para fiscalizar e orientar o exercício profissional nestas localidades. Dara apresentou as propostas da gestão atual do CRESS-PR que incluem dar celeridade à fiscalização e à orientação, atuar em conjunto com diversas frentes, citando a criação da frente parlamentar em defesa do SUAS proposta pela atual gestão, entre outras ações previstas nos diferentes eixos de atuação do CRESS-PR.

A mesa foi mediada pela assistente social Wanderli Machado, integrante da Câmara Temática de Saúde do CRESS-PR. Após a realização do debate com os/as participantes ainda no período da manhã, o seminário teve no período da tarde a realização de oficinas entre os/as assistentes sociais e estudantes de Serviço Social.

Oficinas

Foram dois os temas das seis salas de oficinas realizadas: ‘A Política de Saúde Mental e o exercício profissional’ e ‘A política sobre Drogas na perspectiva dos direitos humanos’. A partir de perguntas direcionadoras sobre o exercício profissional, cada sala teve suas discussões em grupos. Ao final todos grupos apresentaram os principais desafios e estratégias de atuação dentro dos temas propostos, com a proposta de realizar uma sistematização dos itens debatidos. Esta sistematização irá compor as contribuições do Paraná no Seminário Nacional sobre o trabalho do/a Assistente Social na Política sobre Drogas e Saúde Mental que ocorrerá em maio deste ano.

Os debates nas oficinas foram intensos na avaliação dos/as participantes. “Foi muito produtivo pela troca que tivemos, percebendo em todos os espaços da Saúde a dificuldade em termos equipes multidisciplinares”, comentou a assistente social Caudenice Berê da Silva, do município de Santa Fé. Para ela, muitas dúvidas em comum puderam ser debatidas, como questões sobre estratificação de risco, por exemplo, afirmando que será importante ampliar este debate.

A assistente social Irene do Lago, do INSS, comentou que na área de atuação dela foi um debate fundamental: “A Saúde Mental perpassa as diversas políticas e é fato que existe uma precarização muito evidente. Faltam recursos básicos pelo que a gente viu dos/as colegas aqui”. Ela explica que o trabalho em rede não pode ser realizado devido ao desmonte que está acontecendo nos CAPS atualmente.

Os/as acadêmicos/as tiveram momentos de aprendizados e de construção da luta por uma Saúde Mental que priorize o SUS constitucional, contra os retrocessos que estão evidenciados atualmente e que foram expostos no seminário. “As oficinas, além de nos permitirem conhecimento pelo contato com os/as profissionais, foram importantes para entendermos a atual conjuntura de desmonte da Saúde Mental”, explicou a estudante Thaís Rodrigues, que afirmou também que apesar do choque com a realidade proporcionada pelo atual modelo de gestão da Saúde, sentiu que o encontrou fortalece a luta coletiva.